Jovens fortemente taxados
Retiro a seguinte passagem de um texto de Teodora Cardoso publicado da edição Fevereiro/Março da revista Economia Pura:
"A ECONOMIA ENQUANTO CIÊNCIA
A economia tem um estatuto complexo enquanto ciência. (...) Por outro, mais específico, a política económica, que aplica à governação de um país os conhecimentos da teoria, tornou-se cada vez mais importante relativamente à política tout court, (...).
As consequências nocivas para a ciência económica consistem no estímulo ao aparecimento de teorias interesseiras, que supostamente "provam" teses que convêm à ideologia do momento e que as dificuldades de medição dos fenómenos económicos permitem que sobrevivam muito para além do que o seu mérito ciêntífico o justificaria. (...)"
Apesar de não concordar com tudo o que transcrevi esta informação é útil para a análise da questão do desemprego e das políticas que têm em vista reduzi-lo.
Uma ideia comum é a de que os empregadores contratam mais facilmente se existir facilidade de despedimento. Basicamente a decisão de contratar tem um carácter menos permanente para os custos futuros da empresa e como tal o empregador tem menos relutância em contratar. Suponho que é isso que vai na mente dos políticos franceses quando propõem o CPE.
Existem outras ideias como a de que uma redução do salário mínimo diminui o desemprego entre os mais jovens pois são precisamente esses que recebem salários desse nível. Já surgiram medidas em que os jovens têm direito a um salário abaixo do salário mínimo ou então financiado em parte pelo Estado. Vou dispensar-me de comentar os resultados de tais políticas, não é difícil adivinhar, em vez disso vou mostrar as taxas de desemprego em Portugal (INE).
Q3 - Taxa de actividade e taxa de desemprego por grupo etário e sexo | |||||||||||||
Valor Trimestral | Média Anual | C.V. | |||||||||||
Portugal | 4ºT-2004 | 1ºT-2005 | 2ºT-2005 | 3ºT-2005 | 4ºT-2005 | 2004 | 2005 | 4ºT-2005 | |||||
% | |||||||||||||
Taxa de desemprego | HM | 7,1 | 7,5 | 7,2 | 7,7 | 8,0 | 6,7 | 7,6 | 3,1 | ||||
H | 6,3 | 6,5 | 6,5 | 6,7 | 7,0 | 5,8 | 6,7 | 4,5 | |||||
M | 7,9 | 8,6 | 8,1 | 8,9 | 9,2 | 7,6 | 8,7 | 4,0 | |||||
Dos 15 aos 24 anos | HM | 15,8 | 16,0 | 15,3 | 16,5 | 16,4 | 15,3 | 16,1 | 5,9 | ||||
H | 13,7 | 13,0 | 13,6 | 13,4 | 14,6 | 13,5 | 13,6 | 8,5 | |||||
M | 18,5 | 19,7 | 17,6 | 20,4 | 18,6 | 17,6 | 19,1 | 8,5 | |||||
Dos 25 aos 34 anos | HM | 7,8 | 8,9 | 8,1 | 9,0 | 9,4 | 7,2 | 8,9 | 5,2 | ||||
H | 7,0 | 7,2 | 6,8 | 7,4 | 7,7 | 6,0 | 7,3 | 8,1 | |||||
M | 8,8 | 10,7 | 9,5 | 10,8 | 11,3 | 8,5 | 10,6 | 6,9 | |||||
Dos 35 aos 44 anos | HM | 6,2 | 6,6 | 6,3 | 6,2 | 6,8 | 5,5 | 6,5 | 6,5 | ||||
H | 4,9 | 5,5 | 5,1 | 4,8 | 5,3 | 4,4 | 5,2 | 9,9 | |||||
M | 7,7 | 7,9 | 7,6 | 7,8 | 8,6 | 6,8 | 8,0 | 7,6 | |||||
Com 45 e mais anos | HM | 4,6 | 4,8 | 5,1 | 5,5 | 5,6 | 4,5 | 5,2 | 5,0 | ||||
H | 4,7 | 5,0 | 5,2 | 5,7 | 5,6 | 4,5 | 5,4 | 6,8 | |||||
M | 4,5 | 4,5 | 4,9 | 5,2 | 5,6 | 4,6 | 5,1 | 7,0 |
Portugal tem tradicionalmente taxas de desemprego baixas, mesmo assim a taxa de desmprego até aos 25 anos é relativamente mais elevada que qualquer uma das restantes. No nosso país ninguém se lembraria de uma medida como o CPE francês para reduzir o desmprego. Na verdade, os franceses limitam a idade para a qual o CPE é válido, o que não acontece em Portugal. Garantimos assim um mercado do trabalho a dois tempos, um para os mais velhos e que prima pela estabilidade, outro para os jovens e que se destaca pela incerteza e desemprego.
Toda a flexibilidade do nosso mercado laboral resulta principalmente numa relação ainda mais desiquilibrada entre empregado e empregador. Quando se está permanentemente na iminência de despedimento há uma certa tendência para aceitar condições de trabalho mais abusivas. Este é um daqueles elementos que as taxas não captam, tal como não captam a sensação de incerteza e a angústia de alguns jovens que vivem constantemente a entrar e a sair do mercado de trabalho. Para agravar essas sensações há todo um conjunto de expectativas que não se concretizam, expectativas alimentadas com a mentalidade protestante de valorização da actividade profissional acima de qualquer outra coisa e das constantes mensagens de casos de sucesso e de pessoas que chegam ao topo (talvez do arranha céus de onde se irão atirar). A incerteza é um custo bastante elevado a pagar por uma taxa de desemprego mais baixa.
Tais medidas reduzem o desemprego?
A minha posição é que estas ideias cabem perfeitamente naquela descrição que transcrevi no início do texto. A flexibilização de tudo resulta em nada em termos dos objectivos iniciais, é uma ideia que está na moda há mais de 20 anos e que no futuro não produzirá os resultados desejados. Mesmo quando nos enquadramos o problema na situação descrita tradicionalmente em Economia, a flexibilização resulta numa convergência com a taxa de desemprego natural, taxa essa que se desconhece e pode ser maior ou menor que a actual. Mesmo que o desemprego seja menor há custos não quantificáveis associados a essa melhoria relacionados com a incerteza e a melhor ou pior capacidade de lidar com ela. Nunca ocorre aos políticos modernos que grande parte da população valoriza bastante a estabilidade, tal como não ocorrem medidas como diminuir o grau de abertura da economia para proteger sectores sensíveis. Simplesmente não é a moda que domina a "ciência" do momento. Não significa que essas possibilidades fossem solução para o problema, no entanto é de notar que nem sequer são tidas em conta como possibilidades.
Estou de acordo contigo.
Posted by usual_suspect | 22/3/06 20:33
concordo no que dizes mas (como tudo) acho que isto é uma visão redutora do assunto.
Assim que puder faço um texto
Posted by silvio_teixeira | 25/3/06 19:32